Diversidade, em todos os sentidos

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Desde que os movimentos LGBTs começaram a conquistar um tímido (mas importante) espaço de visibilidade nas ruas e na mídia mundial e brasileira, uma discussão que surge sempre entre ativistas, pró e contra os direitos dos homossexuais é se ser gay é uma escolha ou se é algo ‘natural’. No centro deste embate, uma discussão ideológica e filológica sobre o uso do termo ‘orientação sexual’, preferido pelos ativistas LGBT, em contraponto ao ‘opção sexual’, usado por fundamentalistas religiosos e reacionários de todas as linhas.

Este último tem um caráter obviamente pejorativo e é usado para tornar a sexualidade humana (no caso, a homossexualidade), em algo menor, uma besteira que a gente faz e que amanhã pode corrigir. Ao chamar de ‘opção’, diminui-se a complexidade da construção da sexualidade humana, inerente a todas as pessoas, cujas vivências, experiências, e influências ambientais e culturais alteram o resultado final. A ‘opção’ não é uma construção, mas uma escolha. É como abrir o freezer da padaria e escolher entre tablito e chicabon, sem muita reflexão sobre o que se está fazendo. A tal ‘opção sexual’ ignora a complexidade do processo de construção da sexualidade, que influencia quem somos hoje, e reduz ao simplismo da escolha nossos afetos, nossos amores.

Os adeptos da ‘opção sexual’ adoram sustentar seu frágil argumento com a seguinte lógica: “A ciência não provou que as pessoas nascem gays ou lésbicas. Então, ser gay e lésbica é uma escolha. Se não for assim, cadê o gene gay? Onde está o DNA do homossexual?”. Como já se percebe, os adeptos da ‘teoria da opção’, gostam de reduzir a questão a um simplismo infantil. Realmente, a ciência não tem um consenso sobre o que torna pessoas heterossexuais ou homossexuais, mas sabe-se que fatores genéticos (não ligados apenas a um único gene), ambientais, biológicos e culturais moldam a sexualidade humana ainda na primeira infância, e que este processo não pode ser alterado. Ou seja: se você tiver de ser heterossexual, nada mudará este processo. A recíproca é verdadeira para os homossexuais e bissexuais.

(E outra: a ciência não provou que existe ‘gene gay’, mas também não atestou que a sexualidade humana seja passível de escolha. Nestas horas, tem muito religioso que faz ‘uso’ da ciência, mas a ignora em questões como eutanásia e aborto. É a ‘confiança seletiva’, né?)

 

Então não existe ex-gay? Existe sim!

Ok, não existe processo que altere o produto final (e natural) da sexualidade humana. Mas e como existe gente por aí dizendo que é ‘ex-gay’ ou ‘ex-lésbica’, casando, tendo filhos e vivendo uma vida (pretensamente) feliz? Simples: você não molda seus desejos, mas molda sua expressão. Você não escolhe de quem gosta, mas pode emular um sentimento, ‘fingir que gosta’, por conveniência ou opressão. Se não acontecesse assim, milhões de casamentos arranjados pelo mundo a fora não teriam funcionado durante a história da humanidade. Funcionaram, geraram filhos e ‘famílias’, que por mais falta de interesse que houvesse entre o casal, cumpriram seu papel social.

Um ‘ex-homossexual’ é uma pessoa que sente atração sexual e afetiva por pessoas do mesmo sexo, mas que reprime estes sentimentos e busca relacionar-se com pessoas do sexo oposto. Esta escolha raramente acontece de forma espontânea, natural, sendo normalmente ocasionada por pressão da família, dos amigos, da igreja e dos demais grupos sociais que o sujeito está inserido. É o caso dos padres e outros religiosos celibatários, que optam por não fazer sexo (teoricamente), nem com homens nem com mulheres. Os desejos (ou tentações, como eles gostam de chamar) estão lá, mas não encontram vazão, por um motivo ou outro. Neste caso, cabe apenas um exercício de semântica. Se um homossexual deixa de fazer sexo com homens, ele vira um ex-gay. Se um heterossexual entra para uma seita que exige o celibato, ele vira ex-hetero. Certo? Se a gente colocar nestes termos, tudo certo.


O terrorismo psicológico

Em linhas gerais, eu não veria problema algum em um hetero ou gay buscar experiências com o sexo oposto ou com o mesmo sexo, desde que estas experiências façam parte de uma experimentação saudável da sexualidade humana, sem paranóias, cobranças ou obrigações.

Um heterossexual pode experimentar sexo com o mesmo sexo e curtir, passando a ser bissexual ou até mesmo gay/lésbica. O mesmo vale para homossexuais, que durante sua vida, podem descobrir novos desejos, se atrair por outras pessoas, tentar coisas novas. Mas o processo tem de ser natural e saudável, e não imposto por ninguém.

A afetividade das pessoas, em todos os tons que possam existir, não pode ser alvo de maledicências, de ataques morais e até mesmo de terrorismo psicológico/religioso, o que tem levado muitos homossexuais, com seus desejos completamente naturais, a mutilar seus afetos, sua consciência e sua identidade. Não há paraíso, céu ou qualquer outra promessa post mortem que compense negar quem você verdadeiramente é. Não há pressão psicológica em casa, na escola ou no trabalho que não encontre ombros amigos que aceitem você como você verdadeiramente é. Nenhuma pessoa verdadeiramente de bem pode compactuar com tamanha (e silenciosa) violência.

Comentários em: "Opção sexual existe sim!" (15)

  1. Então esta pessoa não “opta” por ser ou não homossexual, opta por não “exercer” sua homossexualidade. Esta pessoa não deixa de ser homossexual, deixa de “estar” homossexual, porque o desejo continua lá. Não é possível “optar” por sentir desejo por A, B ou C.

  2. eu tenho reelaborado a noção de opção sexual como um direito. acredito que precisamos fazer essa reelaboração urgente!

  3. Bom texto, mas vou deixar minha opinião aqui.
    Existe opção sexual? Lógico! Mas isso não se aplica em ser ou não homossexual. A bissexualidade muitas vezes é uma opção do indivíduo (o que não anula o fato que existe sim, pessoas que NATURALMENTE sempre sentiram atração por ambos os sexos). Hoje, com toda essa onda de liberação sexual que estamos tendo, não é raro encontrar heterossexuais que já tiveram experiências homossexuais. O que não quer dizer que eles sejam bissexuais, muito menos gays! Não podemos e não devemos rotular pessoas que, em um certo momento da vida tiveram, por curtição, curiosidade ou qualquer outro motivo, experiências isoladas em relação a isso.
    Em relação ao “Existe ex-gay sim”, discordo totalmente! Continua não existindo ex-gay. Se um homossexual, por pressão religiosa ou qualquer coisa que seja, escolhe viver ao lado de uma mulher, constituir família e tudo mais que a conduta religiosa prega, isso não faz dele “ex-homossexual”, porque a homossexualidade NÃO É comportamental. Do que adianta estar casado, mas viver se controlando, ignorando, repreendendo seus instintos sexuais por pessoas do mesmo sexo? Gay é gay, casado ou não, religioso ou não! Um homossexual pode viver a vida inteira sem tocar em um homem, que continuará sendo homossexual. O que manda define isso não é o comportamento, mas sim o sentimento. Espero ter colaborado. Abração!

    • MarcioRivas disse:

      Isso é assim mesmo. O mesmos LGBT soin os que deveriam ser os primeiros em saber isso. Muito bom comentário.

    • Acredito que a bissexualidade, assim como a homossexualidade, é uma característica da pessoa, não uma escolha.
      Se uma pessoa que se considera hétero e tem curiosidade, passa a se relacionar com os dois sexos, é porque já carregava esses traços em sua condição, já era bissexual, caso contrário, permanece hétero.
      Tenho minhas dúvidas quanto ao bissexual escolher ser bissexual, até porque ninguém é capaz de determinar sua sexualidade. O que pode existir é modinha, pessoas que acham tudo bem ficar com pessoas do mesmo sexo para chamar a atenção, porque é descolado. Existe muito!

  4. Penso mesmo que a escolha seja viver como realmente é ou viver como a sociedade quer que se viva. Mas não se escolhe ser homossexual, transexual, bissexual ou mesmo heterossexual. A sexualidade humana é tão diversa e única em cada pessoa (sou dessas que acreditam que cada pessoa é um universo) que não sou a favor de rótulo algum.

    E eu também não concordo com a expressão “orientação sexual”. Incomoda-me o sentido desse termo, orientação. COmo se o desejo, o afeto fosse algo que pudéssemos guiar e controlar. Tipo: hoje eu estou a fim daquela morena ali, amanhã eu quero a loirinha e depois quem sabe a ruiva?!

    Acredito muito mais na manifestação do afeto, do desejo, do amor. E não vejo necessidade alguma de nominar isso – está tudo dentro do campo da sexualidade humana. As segmentações servem apenas para… para que mesmo?!

  5. Will, excelente texto, me surpreende alguns comentários que exprimem ser contrários ao que você escreveu e na verdade estão concordando com o texto. Orientação sexual para a construção da sexualidade (aspectos inconscientes e próximos ao biológico) e opção sexual (aspectos da consciência e da expressão) pelo direito ao experimentar-se! Grande abraço!

  6. MarcioRivas disse:

    O certo è que eles usam o nome da ciência quando a eles lhes convêm. (conservadores, e sobretudo fanáticos religiosos e tele -predicadores) Por que não dizem o que opinam realmente os cientistas da OMs e etc…? è pura hipocresia. Eles não só não estão envolvidos em assuntos religiosos e morais, que isso sim é opcional, se não que estão metidos em política e se dão e se tomam a libertade de opinar como cientistas, coisa que em alguns países se llama intrusismo e pode até ser delito. E no hambiente religioso é imoral e pecado esse tipo de comportamento dos religiosos, por que é mentira e se eles fossem consequentes não o fariam, por que se eles lessem e entendessem a lista de pecados que tanto nos repetem para dizer que não somos merecedeiros da Graça divina, saberiam que no Reino de Deus os mentirosos não entraram tampouco. Eu acho que nesse céu não haverá muita gente….. pelo menos pastores poucos. Quando eles me vem com este tipo de argumento, eu simplesmente lhes digo que não vou conversar com um mentiroso, que para começar a falar sobre qualquer tema, a primeira coisa é ser honestos, e eles quando come]am a falar sobre opções sexuais, ¨homossexualismo¨ e coisas dessas automáticamente paro e lhes digo que não sigo, por que me estam mentindo e eu não falo com mentirosos. E com muito respeitos lhes faço saber que não gosto que pensem que eu sou troucha, e se não vão dizer nada produtivo não me enteressa. A questão que eles não gostam de serem tratados com preconceito, mas usam este preconceito quando eles acham oportuno para eles. Com que a melhor arma contra este tipo de pessoas é que vejam que a opinião deles não tem valor, e é rejeitada até mesmo por falsa ou redícula.

  7. Heleno disse:

    SOBRE ESTE TRECHO : “Um ‘ex-homossexual’ é uma pessoa que sente atração sexual e afetiva por pessoas do mesmo sexo, mas que reprime estes sentimentos e busca relacionar-se com pessoas do sexo oposto.”

    Existe também a opção católica.A Igreja de João Paulo 2 e do Papa bento XVI é menos afeita ao “terrorismo” protestante. Inumeros grupos de católicos pregam a todos (indempendente que qual seja o rotulo que o mov gay lhe dê : GAYS LESBICAS BISSEXUAIS e HETEROS) a castidade

    A castidade só se é vivida integralmente se for de LIVRE ESCOLHA

    Aos “heteros” (não celibatários) a castidade se resumiria a só fazer sexo dentro de um matrimônio
    Aos ‘lgbts” a castidade só se é vivida plenamente pondo-se fim a ideia de que “se aceitar” envolve algum tipo de apoio a copula genital/anal/oral.

    (A ausencia da prática é bem menos exigida do que a FIRME CONVICÇÃO de que tal ato sexual é danoso. Não basta não fazer sexo gay se o individuo continua a pensar que ele é natural.

    O fato de que ausencia da prática é bem menos exigida tampouco se coaduna com uma hipocrita recusa teorica não vivenciada na praxis)

    Quanto a exigência de que lgbt devem buscar se relacionar com pessoas do sexo oposto so não é publicamente qualificada de ridicula pelos católicos por temores de ofensas a “sensiblidade ecunêmica” de certos grupos protestantes

    Só para relembrar para católicos a castidade só se é vivida integralmente se for de LIVRE ESCOLHA

  8. Lucas disse:

    Gostaria de parabenizar o autor do texto que fez um trabalho muito bem elaborado e com a utilização certa dos conceitos. Também a algumas das pessoas que comentaram e deram um caráter complementador ao texto. Concordo bastante com as colocações expostas…

    Porém gostaria de complementar também com uma informação, de que é recente no Brasil e mesmo no mundo, um movimento chamado Teologia Inclusiva, que aborda uma forma diferente de interpretação bíblica e prova através da História e das passagens bíblicas sobre a homossexualidade e encherga que Deus também os aceita da mesma forma que aceita os heterossexuais. A sexualidade humana é muito ampla e se manifesta de várias formas desde o princípio, contudo valores sociais foram sendo criados e impostos diante de um único padrão do que é “certo”.

    O que as igrejas inclusivas pregam é que, não importa se você é gay ou hétero, mas que Deus te ama e quer que as pessoas abram seu coração para Jesus como seu salvador. O que deve ser ressaltado é que se prega que deve existir uma conduta moral em cima dos valores bíblicos, ou seja, o casal hétero ou gay deve seguir as mesmas regras de santidade, como sexo depois do casamento, e buscar constituir uma família abençoada por Deus.

    Acho isso muito saldável, pois trata da questão homossexual como um aspecto natural do ser humano e mostra para a sociedade que casais gays têm condições de se casar e terem filhos e experimentarem de uma vida de fidelidade conjugal e amor, não essa imagem estereotipada de que o homossexual é uma pessoa promíscua.

  9. João disse:

    Pessoal achar que existe opção sexual é até piada. Se nasce homossexual.

  10. […] do HOMORREALIDADE de Homorrealidade       Por William Delucca para o Blog do @delucca    Desde que os movimentos LGBTs começaram a conquistar um tímido (mas importante) espaço de […]

  11. veronica disse:

    quem começou à usar o termo opção foram os próprios homossexuais, depois que as pessoas acostumaram mudaram pra orientação, a mesma coisa foi com a legenda, antes era GLS, depois GLST, depois GLSTT, depois rsrsrsrsr daqui à pouco vai ser Cachorro, pulgas e carrapatos srsrrsr Agora sério, se mudam tanto é porque não tem certeza, e depende muito do que se quer no momento, a unica coisa que eu acho que é que gays devem ser respeitados como os heteros mas sinto no ar uma campanha “seja vc também um gay”

    • Temo ter de te corrigir, Veronica. Quem criou o termo ‘opção sexual’ foi a sociedade heteronormativa, que impõe a heterossexualidade como o padrão, e as outras sexualidades como ‘alternativas’, como ‘opções’. Assim como a homo e a bi, a heterossexualidade é uma das sexualidades possíveis, e nenhuma delas é uma opção. São construções complexas, e não simplistas, como alguns fingem parecer ser.

      Em relação a ‘sigla’, outra confusão sua. O termo GLS (gays, lésbicas e simpatizantes) ainda existe, e é usado para lugares, ambientes gay-friendly, eventos, etc. Já o termo LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transsexuais) é usado para definir os direitos, a cidadania e o ativismo político relacionado a este grupo. Ficou mais fácil de entender?

      E o que existe ‘no ar’ é uma campanha de ‘seja hetero você também’, já que quem é forçado, por conta do preconceito e da discriminação, a esconder ou até fingir um desejo por pessoas do mesmo sexo são os homossexuais. 😦

      • Jhenni disse:

        Gostaria de acrescentar que não são só os heteronormativos que acreditam em opção sexual. Feministas radicais acreditam na lesbianidade como opção política, chegando até a dizer que não existe orientação sexual, que todo intercurso hétero é estupro e os homens são inimigos. Por isso a diferença entre lésbica feminista e feminismo lésbico (separatista)

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